Retrato de Bolso

Tinha um cara lá usando pijamas e falando um par de coisas sem sentido, como se ainda estivesse sonhando. “Me vê outro trago” falei pro garçom, enquanto duas belezas entravam entre assobios de machos e fêmeas perto da mesa de sinuca. Então, um casal levantou e começou a dançar, sem tirar os olhos um do outro, sorrindo só com o canto da boca, ignorando o resto. “Ele vai se dar bem” ouvi alguém dizer; “Ela sabe dar bem” ouvi alguém responder.

E de repente, aconteceu um silêncio, uma furtiva calmaria dos espíritos trôpegos. “Ouçam a música” sussurravam sem falar… Ou também podia ser só eu. E o garçom chegou com o trago.

– Espera aí.

E logo partiu novamente. O sonho do cara de pijamas parecia ser um fato consumado de alguma espécie, original e comum a todos. Fui até ele. Fiquei perto, encostado numa coluna suja, logo atrás do grupo que ouvia suas palavras – nada messiânico, só um grupo de quatro camaradas dando ouvido a uma pessoa diferente. De vez em quando riam, divertidos.

– O quinto! – O Pijama falou comigo – Responda: o baixo ressoa em harmonia, do alto as garças voam norte, divergir; credo cruz credo qual credo cruz credo eu enfim? Retomar, fortuna.

Putz!

– A guitarra cintila a melodia, o gato dorme sob a mesa, encontrar; cruz credo cruz nesta cruz credo eu. Concluir, destino.

– Ah! – Exclamou maravilhado – Honesto feito o quê?

– Feito o céu – Respondi ensolarado.

Pijama olhou pra mim com uma expressão mui franca e querida; retribuí com um sonoro sorriso. Os quatro camaradas olhavam com ares de deslumbre, incapazes de compreender a mágica dialógica que ocorrera diante de seus olhos. Havia uma garota entre eles. Pisquei pra ela e parti.

“Então havia um sol lá atrás…” pensei cá comigo, enquanto saía de mãos no bolso e respirando plenamente.

A rua se produziu à minha frente em outro ritmo, outro espectro de cores elétricas.

– Você nem me respondeu.

– Eu sei, queridinha… Mas ando tão cheio de coisa pra fazer que acabo me esquecendo.

– Você não gosta de mim.

– Ó, nem começa que não é assim… Você sabe.

Ele tenta o bote. Ela afasta o rosto, franzindo.

– Você sabe.

Ele insiste assim e ela deixa.

Lírico!

E o vento bateu frio na cara enquanto caminhei noite adentro…

Deixe um comentário